segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Como se tornar um profissional de Paleontologia no Brasil (parte 2)




COMO SE TORNAR UM PROFISSIONAL DE PALEONTOLOGIA NO BRASIL
parte 2 de 2






Veja também: Como se tornar um profissional de paleontologia no Brasil (parte 1)?

 

Uma vez que você já escolheu o curso superior, o passo seguinte é se dedicar em uma boa graduação e pós-graduação que farão de você um bom profissional de paleontologia. Alguns pensam que se formar em Paleontologia é muito difícil... Mas não é mais difícil que qualquer outro curso superior.

A formação de paleontologista tem as seguintes etapas:

1 – Graduação (quatro a cinco anos)
2 – Pós-graduação
2.1 – Mestrado (dois anos)
2.2 – Doutorado (quatro anos)
2.3 – Pós-doutorado (um ano)

Cumprindo as etapas 1 e 2.1 (graduação e mestrado), você já é considerado um paleontologista habilitado. Mas muitos seguem adiante nos estudos e avançam ao doutorado e, mais raramente, ao pós-doutorado.
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Durante o curso Superior

Bem, a esta altura, o foco dos estudos ainda é amplo. Se você faz Geologia, aprenderá a reconhecer minerais, rochas, como elas se transformam, e muitas técnicas aplicadas por geólogos para a resolução de problemas práticos da área. Mas durante este período de aprendizado de Geologia, recomendo que já se dedique a alguma pesquisa em Paleontologia. Os institutos de Geociências das universidades brasileiras têm, por tradição, laboratórios de Paleontologia que aceitam estagiários de graduação. Uma boa dica é procurar por algumas matérias no curso de Biologia, para sanar algumas deficiências que naturalmente terá para trabalhar na Paleontologia como geólogo. Sugiro matérias de evolução, filogenia e taxonomia de invertebrados e vertebrados.

Se você faz Biologia, aprenderá a descrever os seres vivos, como eles interagem entre si, suas minúcias e fisiologia, entre outras matérias. Como a maior parte dos laboratórios de Paleontologia se encontra em cursos de Geologia, provavelmente você precisará procurar por eles neste instituto. Caso a sua universidade não tenha o curso de Geologia e seu instituto de Biologia não tenha um laboratório de Paleontologia, não hesite em procurar uma opção em outra universidade próxima. Assim como recomendei disciplinas de Biologia para os estudantes de Geologia, faço a sugestão de que os de Biologia procurem por matérias de Geologia que sanem suas deficiências naturais nas matérias da Terra. Os alunos externos à Geologia com quem trabalhei geralmente tinham enormes dificuldades para descrever rochas sedimentares, reconhecer ambientes antigos pela análise dessas rochas, compreender a dimensão do Tempo Geológico (milhões e bilhões de anos) e perceber as sutilezas e implicações dos processos de preservação e as informações que eles podem nos dar. Por isso recomendo que os alunos de Biologia façam matérias de sedimentologia, estratigrafia, tectônica, geologia histórica e tafonomia.


A universidade de Brasília é uma das instituições que possuem laboratórios de Paleontologia e oferecem estágios para alunos de graduação (foto: Fernando Maia Jr).



Além destas matérias que devem ser cursadas em outros institutos, recomendo com veemência a participação em cursos no período de férias, em universidades e museus. Geralmente as universidades coordenam cursos com uma semana de duração para ensinar a descrição de grupos específicos de fósseis ou técnicas de preparação (retirada dos fósseis da rocha). Não tenha receio de viajar para fazer esses cursos, pois atender a eles e outras universidades é uma ótima oportunidade de conhecer diferentes profissionais da área e enriquecer nosso conhecimento. Em congressos e simpósios de Paleontologia e Geologia estes cursos são sempre muito bons e proveitosos.

Quanto mais tempo você se dedicar aos estágios e cursos na área, melhor preparado estará para trabalhar como paleontologista. E, de quebra, eles enriquecem o currículo e melhoram sua disputa pelas vagas do mestrado.
O ideal é que você trabalhe com estágios em paleontologia durante todo o curso de graduação. Assim você já entra no mestrado quase como paleontologista, pois a experiência de vários anos de estágio em laboratório é a melhor escola. Isso melhorará seu desempenho na próxima fase, do mestrado.

Esse estágio pode ocorrer na forma de Programas de Iniciação Científica (PIC, ou PIBIC em algumas universidades). Os PICs são importantíssimos para a formação de um paleontologista. Eles são a execução de uma pesquisa com duração de um ano, em que o estagiário analisa fósseis e chega a um resultado científico. O resultado dessa pesquisa é geralmente apresentado na forma de um relatório e um painel que deve ser apresentado pelo aluno. E, para melhorar, em muitos casos eles são remunerados. Esse é o primeiro momento em que você poderá se sentir um paleontologista de verdade, coletando, analisando e publicando um resultado científico da mesma forma que um pesquisador profissional faz. Se você pretende seguir para o mestrado, faça um PIC!

A execução do PIC é ainda mais inteligente e proveitosa se você escolher o tema de acordo com suas ambições de mestrado e, também, o mercado de trabalho. Se você entrar no mestrado com alguma experiência no tema, pela execução do PIC, sua pesquisa será bem mais fácil. E não se esqueça que tanto o PIC quanto a pós-graduação vão te preparar para ser um profissional, então o ideal é que tudo seja no mesmo tema. É claro que para isso você tem se conhecer e ter segurança de qual área da Paleontologia te interessa e vai te satisfazer como profissional. Não é menos importante avaliar, na hora de escolher esse tema, as possibilidades de encontrar emprego depois de formado. A escolha de um tema que te ofereça mais possibilidades de trabalho é inteligente e com certeza deve ser levada em consideração.

Então, desempenhando ao longo da graduação essas atividades que descrevi acima, você descobrirá que a Paleontologia é muito mais que dinossauros. É, sempre começa com dinossauros, mas há muitos outros fósseis legais. Na verdade, os dinossauros são uma pequena parte de uma ciência muito mais vasta e interessante. Isso provavelmente mudará suas ambições na área, pois ocorrerá a descoberta de muitos temas atraentes na Paleontologia. O que acha de estudar peixes fósseis? De crocodilos? De fezes? De plantas? De pegadas? Conhece microfósseis? Os microfósseis são os fósseis que mais trazem informações científicas do passado.

Outra boa dica é se esforçar para publicar o resultado de suas pesquisas do PIC em artigos completos em revistas científicas. Eu saí da graduação com dois artigos publicados e eles não só foram importantes para que eu pudesse aprender de forma precoce como redigi-los, mas também porque são ótimo diferencial no currículo quando se disputa uma vaga no mestrado.

O mestrado - quando você realmente se torna um paleontologista

O mestrado é uma pesquisa científica em paleontologia que você tem dois anos para concluir. Você escavará um conjunto de fósseis (ou os receberá de um museu) e os estudará para chegar a algum resultado, como a identificação das espécies, do ambiente, da idade, etc. A maior parte dos mestrados é feita com remuneração para o aluno, a chamada “bolsa”.

Para fazer o mestrado, você precisará escolher o tipo de fóssil no qual pretende se especializar. Esse é o momento da decisão. Uma vez que optar por estudar fósseis de plantas, mamíferos, corais... você carregará o título de profissional nesse tipo de fóssil para o resto da vida. Mas isso não quer dizer que você estará amarrado e um grupo por toda a carreira. Você pode optar por outro grupo na fase seguinte, o doutorado, mas o ideal é que sempre trabalhe com o mesmo tipo de fóssil (na graduação e pós-graduação!), para que adquira o máximo de experiência naquele tema. Eu, por exemplo, comecei meus estudos com ostracodes na graduação e continuei com o mesmo grupo no mestrado. Isso me deu a vantagem de que já era craque na descrição deles ao entrar no mestrado, e isso facilitou muito a minha pesquisa durante os dois anos do mestrado.

Assim como mencionei sobre a escolha do tema do PIC, durante a graduação, a escolha do tipo de fóssil ou tema a ser estudado é mais inteligente se você observar como está o mercado de trabalho. Esse detalhe é relevante, então leve em consideração as oportunidades profissionais que o tema te dará.

E como faço esse mestrado? Onde? Em muitas universidades. Eu fiz o meu na Universidade de Brasília. A maior parte deles é oferecida por programas de pós-graduação em Institutos de Geologia. Outra dica que dou é a escolha do instituto, apesar de geralmente não termos muitas opções. Se você fez Biologia, por exemplo, sugiro fazer mestrado no instituto de Geologia, e vice-versa (apesar  que pós-graduação em Paleontologia nos institutos de Biologia é rara). A convivência com profissionais da área oposta é enriquecedora e ajuda no entendimento de uma Paleontologia mais global.

A própria universidade consegue recursos para estes trabalhos científicos. Um professor recebe a tarefa de te orientar, de acompanhar sua pesquisa para garantir que ela chegará ao resultado esperado. Ele recebe uma verba pequena para a escavação e análise dos fósseis Até você pode receber um salário modesto, dependendo de como se vincular ao laboratório. E durante o meu mestrado eu aproveitei para trabalhar como assistente de curadoria de um museu, onde aprendi a fazer exposições e a cuidar do acervo de fósseis, como num museu grande.


O mestrado te transforma num profissional habilitado para desempenhar a profissão (foto: Dr. Kelli Trujillo).


Ao final do mestrado, você deverá entregar uma dissertação redigida, com toda a análise dos fósseis, e será avaliado por uma banca de professores especialistas no assunto. A conclusão do mestrado com tema em Paleontologia faz de você um paleontologista profissional, licenciado para trabalhar na área. E quanto mais artigos de qualidade você publicou em revistas científicas neste período, mais respeitado você será por seus pares.

O doutorado

Após o mestrado, é comum no Brasil que se faça o doutorado. Ele é um projeto de pesquisa muito semelhante ao mestrado, mas tem duração longa (quatro anos) devido ao maior aprofundamento da pesquisa. A ideia do doutorado é capacitar o paleontologista na independência científica e fazer dele um profissional habilitado a criar métodos inovadores de estudo. No fundo, muitos dos doutores em Paleontologia buscaram este título para estar aptos a disputar vagas de professor universitário, uma das saídas mais comuns para se trabalhar com Paleontologia no Brasil.



Trabalho de paleontologista em pesquisa universitária (foto The University of Michigan).


De forma análoga ao mestrado, o doutorado conclui-se com a apresentação de uma tese redigida e a avaliação de uma banca de professores especialistas no assunto. Após a obtenção do título de doutor, o paleontologista passa a assinar suas pesquisas com este que é o título máximo da profissão.

O pós-doutorado

Esta fase é incomum. Tão incomum que brinca-se nas universidades que “o doutor desempregado faz o pós-doutorado para poder se sustentar com mais um ano de bolsa”. Brincadeiras à parte, o pós-doutorado é uma pesquisa menor (com um ano de duração) na busca de um resultado em Paleontologia. Aqueles que concluem esta última fase passam a assinar com o título de pós-doutor.


Na próxima coluna Les Gigantes debaterei quais são as possibilidades de trabalho que um paleontologista encontra no Brasil!





Autor: Henrique Zimmermann Tomassi
Paleontologista oficial do Jurassic Universe
Tem experiência em curadoria de material geológico e no ensino de Paleontologia e Geologia. Atualmente trabalha com fósseis em empresa de serviços privados em Paleontologia e Geologia Sedimentar

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